... faz campeonato de desgraça.
Não há quem não conheça alguma criatura assim:
- Se você cai de cama devido a uma gripe, ela lhe conta sobre a ocasião em que quase morreu de gastroenterite e ficou internada durante 15 dias, sendo alimentada apenas no soro.
- Você comenta que está com dor-de-cotovelo por uma desilusão amorosa, e ela desagua uma lista interminável de torturas sofridas durante seu divórcio litigioso.
- Alguma situação no ambiente de trabalho incomoda? Não im-por-ta: ela acabou de ser demitida. E ainda lhe joga na cara que você não tem o direito de reclamar, porque a grande maioria da população brasileira em idade produtiva vive apenas da economia informal. Sem contar os pobrezinhos lá na África que ainda precisam lidar com a subnutrição, as guerras e a pandemia de AIDS!
Há gente que, simplesmente, não traz no DNA o gene do simancol. É uma gente totalmente incapaz de parar de cutucar o próprio umbigo, botar a cabeça zarolha para funcionar e perceber que, quando alguém está sofrendo, relatar um sofrimento ainda maior simplesmente não resolve. É até um tiro que pode sair pela culatra, porque exalar tanto baixo astral, certamente, deixa qualquer um ainda mais deprimido!
O que leva um ser humano a desenvolver essa mania de competir pelo prêmio de maior desventura? Necessidade de controle? Baixa auto-estima? Alguma noção distorcida de solidariedade? Ou seria mera vontade de espezinhar?
É claro que ninguém – pelo menos, ninguém privado de tendências sociopáticas – quer que as criancinhas da África passem fome. Mas, em termos de microcosmo, essa é uma questão (os deuses que me perdoem, mas é verdade) totalmente abstrata.
Não se trata de egocentrismo ou maldade, mas de um instinto de auto-preservação perfeitamente natural à espécie humana, anterior mesmo à época em que resolvermos ficar pelados e nos equilibrar sobre os dois pés. Lá na meiuca de nossa massa cinzenta, afinal, ainda existe um cérebro reptiliano que, de vez em quando, bota a cabecinha de fora e faz de tudo para estabelecer-se como o Alfa da "parada".
O cerne da questão é que, quando há uma dificuldade pessoal com consequências imediatas e tangíveis, o resto das agruras do mundo se torna extremamente irrelevante: uma simples unha encravada, para quem está com o dedão latejando de dor, é muito mais importante do que as guerras no Oriente Médio – ainda que o seja apenas momentaneamente.
Mesmo porque a dor é, em sua essência, uma atividade das mais solitárias.
O que se quer, nessas horas, não é sentir-se diminuído e humilhado pela maior intensidade da infelicidade alheia, mas receber alento. É ouvir coisas que acalentem, tranquilizem e ajudem o coração a encontrar forças e equilíbrio para solucionar o problema, lavar a alma e, somente então, plenamente recuperado, estender a mão e assumir a parcela cabida no cuidado do próximo e de suas aflições.
Felizmente, eu tenho amigos com boa genética...
4 comentários:
Ai meu Deus! Eu também detesto!!
Acabei de dizer que vc tava sumida. Coloquei um meme lá no blog... vê se responde.
bjos!
Que rapidez no comentário! Rsrsrs
Pois é! Postei e olhei para o seu link e vi que tinha novidade!!!!
ahahaha... preciso comentar que a palavra de confirmação deste comentário é: cornes....
Eu detesto ,mas detesto com todas as minhas forças, liçãozinha barata de moral.Tô de saco cheio. Uma vez reclamei pra uma amiga que estava mal por causa de poucas e boas que um ex namorado doido me aprontou, ao que ela responde e emenda" Vc deveria é ficar feliz pq vc é médica, tem emprego e tem carro. Tem gente que passa fome, que está desempregada e que não tem sequer um carro p/ andar" Algo do gênero. Como se o fato de ser médica e ter carro me conferisse imunidade aos problemas decorrentes de relacionamentos afetivos. Virei uma onça com a amiga e disse a ela poucas e boas.
Hoje vivo uma situação parecida, embora um pouco diferente, vc sabe. Vc sabe o momento que estou passando, a dor que sinto nesse momento, e tudo o que eu queria era um " te entendo e estou do seu lado", mas não. Tive que ouvir um sermão enorme criticando minha conduta em relaçao ao fato/ tive que escutar lenga lenga e conselhos sobre assuntos que não tinhm nada a ver com o motivo da minha tristeza, sobre os quais eu ~ NÃO tinha pedido opinião.E o " fala que te escuto", " entendo vc", " estou do teu lado", eu escutei de vc,Pat, que está longe, mas que teve alma p/ me entender...
beijos
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